Itinerante


Olha que já fui mais forte do que pensaria que fosse, já me arrancaram uma vida inteira de terra, mas conheci muita gente boa e degraus de oportunidades e estou aqui não estou? Queria voltar naquelas noites de temporais de choro e me acalmar os soluços para que eu me aviasse que estariam por vir coisas boas.

Aquela ansiedade que me matava. Sofrimento por antecipação. Me chateio quando ponho vírgula onde não tem, quando ciso uma frase, um dia.  Boba, boba. A gente vive em meio a um roseiro e não sabe. Veja que para um cego que tateia uma rosa reconhece a suavidade das suas pétalas porque soubera do arisco dos seus espinhos. Bem assim a vida, somos cegos, não vimos seu começo, não vemos seu fim, e não entendemos do um ao quatro até que se chegue ao cinco. E eu a cada quilômetro que me distanciava da minha história até ali eu rezava, de bochechas irrigadas de lágrimas, rezava. Rezava à um Deus que eu me agarrava sem saber do que Ele me tinha reservado, e rezava como quem quisesse entender e suportar essa lida itinerante. 

Foram dois dias naquele retângulo com rodas, da janela não se entrava brisa, talvez por isso me faltasse o ar no pulmão. Um medo de menina divido no abraço ao urso de pelúcia dado pela vó que despedira em prantos na rodoviária, pois esta fora a última imagem que tivera dela.

Dizem que distância dói. Dói e fere. Quando cicatriza fica uma saudade tão gostosa, tão gostosa. Olha vó, não chore não que eu tô bem; cresci e até engordei, trabalho, namoro e estou para me formar, tô feliz viu... E eu to indo, caminhando no meu roseiro.


BRITO, Emilly

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